quarta-feira, 13 de maio de 2020

O Crente Carnal

O CRENTE CARNAL

(Trecho do livro "O homem espiritual" de Watchaman Nee) 

O Senhor Jesus, ao ir à cruz, levou sobre si não só nossos pecados, mas também nossos seres. Paulo enunciou este fato ao proclamar «que nosso velho homem foi crucificado com ele». O verbo «crucificado», no original, está em tempo aoristo*, o qual denota que nosso velho homem foi uma vez e para sempre crucificado com Ele. Como a cruz de Cristo é um fato consumado, assim também nosso ser crucificado com Ele é também um fato consumado.

 * aoristo grego tempo verbal que exprime a ação pura e simples sem que dele, se cogite duração ou acabamento. O aoristo indicativo exprime um fato passado, do qual a duração breve ou longa não tem nenhum interesse para o sujeito falante. Em realidade, ao empregar o aoristo o sujeito falante objetiva apenas a ação em si mesma, sem lhe importar o grau de acabamento.                                                                                                   (Nota da tradutora)

 Apropriação:

Em Deus nossa carne já foi crucificada

Temos que nos apropriar deixando o Espírito Santo fazer isto ser uma experiencia visível e exterior.

Em Deus nós morremos com Cristo para com ele ser ressuscitados.

Temos que nos apropriar deixando o Espírito Santo fazer isto ser experiencia visível e exterior

Como Paulo, todos os crentes poderiam ser cheios com o Espírito Santo no momento de acreditar e no batismo (comparar Atos 9:17, 18). 

Por desgraça, muitos ainda estão controlados pela carne como se não tivessem morrido e ressuscitado. 

Estes não acreditaram de verdade no fato consumado da morte e a ressurreição de Cristo por eles, nem obraram sinceramente segundo a chamada do Espírito Santo a seguir o princípio da morte e da ressurreição. Segundo a obra consumada de Cristo já morreram e foram ressuscitados, e segundo sua responsabilidade como crentes deveriam morrer ao eu e viver para Deus, mas na prática não o fazem. Estes crentes podem ser considerados anormais. Sem dúvida, não devemos pensar que esta anormalidade é exclusiva de nosso tempo. Faz muitíssimo tempo o apóstolo Paulo se encontrou em uma situação semelhante entre crentes. Os cristãos de Corinto eram um exemplo. Ouçam o que lhes disse: “E eu, irmãos não vos pude falar como a espirituais, mas como a carnais, como a criancinhas em Cristo. Leite vos dei por alimento, e não comida sólida, porque não a podíeis suportar; nem ainda agora podeis; porquanto ainda sois carnais; pois, havendo entre vós inveja e contendas, não sois porventura carnais, e não estais andando segundo os homens?” (1Corintios 3:1-3).

Aqui o apóstolo divide a todos os cristãos em duas classes: os espirituais e os carnais. Os cristãos espirituais não têm nada de extraordinário: são simplesmente normais. São os carnais os que saem do normal, os que são anormais. Os de Corinto eram deveras cristãos, mas eram carnais, não espirituais. Nesse capítulo Paulo afirma três vezes que eram homens carnais. Pela sabedoria recebida do Espírito Santo, o apóstolo compreendia que tinha que identificá-los antes de poder lhes oferecer a mensagem que necessitavam. A regeneração bíblica é um nascimento pelo qual a parte mais íntima do ser do homem, o espírito, profundamente oculto, é renovado e habitado pelo Espírito de Deus. Tem que passar um tempo até que o poder desta nova vida alcance o exterior: ou seja, até que se estenda do centro até a circunferência. Por isso não podemos esperar encontrá-lo forte nos jovens nem a experiência dos pais, manifestadas na vida de um bebê em Cristo. Embora um crente recentemente nascido possa comportar-se fielmente, amando ao Senhor e distinguindo-se com seu zelo, ainda necessita tempo para ter ocasião de saber mais da maldade do pecado e do eu e para saber mais da vontade de Deus e dos caminhos do Espírito. Por muito que possa amar ao Senhor ou amar à verdade, este novo crente ainda anda no mundo dos sentimentos e dos pensamentos e ainda não foi provado nem refinado com fogo. Um cristão recém-nascido não pode evitar ser carnal. Embora esteja cheio do Espírito Santo, mesmo assim não conhece a carne. Como pode alguém ser libertado das obras da carne se não reconhecer que essas obras nascem da carne? Por isso, considerando sua autêntica condição, os cristãos que são crianças recém-nascidas são em geral da carne.

A Bíblia não espera que os novos cristãos sejam espirituais instantaneamente, mas se depois de muitos anos continuam sendo crianças, então sua situação é verdadeiramente muito lamentável. Paulo mesmo diz aos coríntios que, no princípio, os tinha tratado como homens da carne porque eram meninos recém-nascidos em Cristo e que agora quando lhes escrevia deveriam ser já adultos. Em vez disso, tinham esbanjado suas vidas, continuavam sendo meninos e por isso ainda eram carnais. Para ser transformado de carnal a espiritual não é necessário tanto tempo como pensamos atualmente. Os crentes de Corinto procediam de um ambiente pagão categoricamente pecaminoso. Ao fim de uns poucos anos o apóstolo já via que tinham sido meninos por muito tempo. Tinham estado muito tempo na carne, porque então já tinham que ser espirituais. O propósito da redenção de Cristo é eliminar tudo o que obstaculize o controle do Espírito Santo sobre toda a pessoa para que desse modo possa ser espiritual. Esta redenção não pode falhar jamais porque o poder do Espírito Santo é superabundante. Da mesma maneira que um pecador carnal pode converter-se em um crente regenerado, um crente regenerado, mas carnal pode ser transformado em um homem espiritual. O que é lamentável é encontrar cristãos que não realizaram nenhum progresso em sua vida espiritual ao longo de vários anos e até décadas! E estes mesmos se assombram quando encontram alguém que, ao fim de uns anos, empreende uma vida do espírito.

 

Consideram isso como algo muito estranho e não veem que se trata simplesmente de algo normal, do normal crescimento desta vida. Quanto tempo faz que creem no Senhor? São espirituais? Não devemos nos tornar meninos velhos, entristecendo o Espírito Santo e prejudicando a nós mesmos. Todos os regenerados deveriam ambicionar um desenvolvimento espiritual, permitindo que o Espírito Santo governe sobre tudo, para que em um período de tempo relativamente curto possa nos levar ao que Deus dispôs para nós. Não devemos perder o tempo sem fazer progressos. Então, quais são as razões para não crescer? Possivelmente há duas. Por um lado, pode ser devido à negligência dos que, tendo a seu cargo as almas dos jovens crentes, possivelmente só lhes falam da graça de Deus e de sua posição em Cristo, mas se esquecem de animá-los a procurar experiências espirituais. (Melhor dizendo, possivelmente os que têm outros sob seu cuidado, também desconhecem a vida no Espírito. Como podem semelhantes pessoas guiar outros a uma vida mais abundante?) Por outro lado, pode ser porque aos próprios crentes não interessam os assuntos espirituais. Supõem que basta estar salvo, ou não têm apetite espiritual ou simplesmente não estão dispostos a pagar o preço para poder avançar. Como consequência deplorável disto, a igreja está repleta de meninos grandes. Quais são as características dos carnais? A mais destacada é que continuam sendo meninos muito tempo. A duração da infância não deveria passar de uns poucos anos. Quando uma pessoa nasce de novo ao acreditar que o Filho de Deus expiou seus pecados na cruz, simultaneamente deveria acreditar que foi crucificado com Cristo, para que assim o Espírito Santo possa libertá-lo do poder que a carne exerce em nós. Naturalmente, se desconhecer este fato, permanecerá na carne durante muitos anos. A segunda característica dos carnais é que são incapazes de assimilar o ensino espiritual. «Vos alimentei com leite, não com comida sólida; porque não estavam preparados.» Os coríntios se orgulhavam enormemente de seu conhecimento e de sua sabedoria. De todas as Igrejas desse período, a de Corinto era provavelmente a mais instruída. Paulo, em sua carta, dá graças a Deus por seu grande conhecimento (1:5). Se Paulo lhes pregava um sermão espiritual podiam compreender cada palavra. No entanto, toda sua compreensão estava na mente. Embora soubessem tudo, estes coríntios não tinham o poder de expressar na vida o que sabiam. Muito provavelmente hoje em dia há muitos crentes que sabem tanto e tão bem, que até podem pregar a outros, mas que ainda não são espirituais. O autêntico conhecimento espiritual não se encontra em pensamentos maravilhosos e misteriosos, mas sim na experiência espiritual real através da união da vida do crente com a verdade. Aqui a inteligência não serve, e o anseio pela verdade também é insuficiente. O indispensável é um caminho de total obediência ao Espírito Santo, que é o único que nos ensina de verdade. Todo o resto é a simples transmissão de conhecimento de uma mente a outra. Estes dados não tornam espiritual alguém que seja carnal. Pelo contrário, na realidade sua carnalidade transformará em carnal todo seu conhecimento «espiritual». O que necessita não é mais ensino espiritual, mas sim um coração obediente que esteja disposto a ceder sua vida ao Espírito Santo e que ande pelo caminho da cruz segundo o mandamento do Espírito. Um maior ensino espiritual só reforçará sua carnalidade e servirá para que se engane e se considere espiritual. Por acaso não diz a si mesmo: «De que maneira poderia saber tantas coisas espirituais se não fosse espiritual?» No entanto, o autêntico questionamento deveria ser: «Quanto sabe deveras da vida, e quanto do que sabe é um produto da mente?» Que Deus tenha misericórdia de nós. Paulo escreveu sobre mais outra evidência da carnalidade: que «havendo ciúmes e rivalidades entre vós, não são da carne e se comportam como os outros homens?» O pecado do ciúme e da rivalidade é uma prova eminente de carnalidade. Na igreja de Corinto abundavam as dissensões, coisa que fica confirmada com afirmações tais como «Eu sou de Paulo; ou Eu de Apolo; ou Eu sou de Cefas; ou Eu de Cristo.» (1Co. 1:12). Inclusive os que diziam «sou de Cristo» também eram carnais, porque o espírito da carne sempre e em todas as partes é ciumento e litigioso. Estes eram indefectivelmente carnais ao declarar-se cristãos com essa atitude de espírito. Por muito bonita que soe a palavra, qualquer jactância sectária não passa de balbucios de um bebê. As divisões na igreja são devidas exclusivamente à falta de amor e à carnalidade.

(Trecho do livro "O homem espiritual" de Watchaman Nee)